GOVERNANÇA CORPORATIVA,
LEI ANTICORRUPÇÃO & COMPLIANCE
|
GOVERNANÇA CORPORATIVA
Esse artigo visa, discutir a relação da Governança Corporativa, sua
aplicabilidade no dia-a-dia das sociedades empresarias e as razões pelas quais
ganhou destaque no meio empresarial, com a Legislação de Combate à Corrupção
hoje em vigor no Pais, mas notadamente a Lei Federal 12.846/2013.
A par da estrutura básica do instituto da Governança, discorrer-se-á
sobre alguns aspectos práticos com o intuito de apontar e esclarecer aos
colegas advogados a forma de como se pode atuar nessa seara.
O principal movimento surgiu nos Estados Unidos e Inglaterra, na
primeira metade da década de 90, liderado por acionistas sem poderes de gestão,
que observaram um abuso da diretoria executiva, da inércia dos conselhos de
administração inoperantes e omissões das auditorias independentes. Observou-se
que nas sociedades em que há a separação entre a propriedade (acionistas) e a
gestão (Diretoria), frente a uma determinada situação, a diretoria pode adotar uma
decisão que maximize o bem estar pessoal dos membros, em detrimento da opção
que mais beneficiaria a sociedade empresária (e por consequência os
acionistas). Os estudiosos nominaram este conflito de "conflito de
agência".
O Instituto de
Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), sociedade civil de âmbito
nacional, sem-fins lucrativos, fundado em 27 de novembro de 1995, tem o
propósito de ser referência em Governança Corporativa, contribuindo para o
desempenho sustentável das organizações e influenciando os agentes da nossa
sociedade no sentido de maior transparência, justiça e responsabilidade:
"Governança Corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas
e monitoradas envolvendo os relacionamentos entre acionistas/quotistas,
conselho de administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal.
As boas práticas de governança corporativa têm a finalidade de aumentar o valor
para a sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para sua
perenidade."
A Governança Corporativa, portanto, pode ser definida como mecanismos
eficientes utilizados pela empresa, capazes de encontrar a decisão que mais
esteja alinhada com a finalidade empresarial, por consequência, aumento de
valor para própria empresa. A finalidade desses mecanismos são, em última
análise, a qualidade e a transparência das informações divulgadas ao mercado.
No conceito geral de governança corporativa, assume-se que as
decisões e os objetivos de uma empresa regida por este instituto sejam isentas
de interesses pessoais dos gestores e/ou acionistas controladores e que decisões
estratégicas sejam sempre precedidas por um amplo debate de uma equipe
multidisciplinar e experiente. O resultado desta dinâmica é a confiança dos
investidores. Quanto mais investidores houver, menor será o custo de captação
de recursos para novos investimentos e maior será a valorização das ações ou
quotas da empresa.
A administração, conjunto de regras e normatização para a boa
governança então deverá ser definida a
partir da natureza jurídica da empresa, se do terceiro setor, cooperativas,
sociedades limitadas ou sociedades anônimas.
Não basta, porém, apenas a criação de regras que assegurem as
melhores decisões para empresa, é preciso ainda monitorá-las, avaliá-las
constantemente e principalmente assegurar que, de fato, as regras estão sendo
aplicadas.
As empresas que obrigatoriamente adotam boas práticas de Governança
Corporativa devem possuir um conselho de administração formado por profissionais
qualificados, de diferentes formações e experiências, os quais chegarão aos
melhores resultados. Observe que um grupo multidisciplinar possui melhores
condições de alcançar uma decisão que maximize os resultados da empresa do que
uma única pessoa.
Um dos instrumentos de orientação para boa prática de boa governança
corporativa é o Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC,
que estabelece princípios e normas de auditoria e governança.
A reforma da Lei das Corporações implementou direitos dos acionistas
minoritários, determina transparência na administração e nomeia a CVM como
órgão regulamentador do mercado e das atividades das empresas que negociam os
papeis no mercado de investimentos e ações.
A Comissão de Valores Imobiliários – CVM –regulamenta o mercado de
capitais e a partir da nova lei do mercado, editou a Cartilha de Recomendações
sobre Governança Corporativa (CVM Guidelines).
A legislação visa, entre outros itens de relevância, proteger
acionistas minoritários que não tem poder de voto ou veto – contra acionistas
de ações preferenciais e majoritários. A CVM Guidelines prevê voto e consulta e
direitos aos acionistas minoritários em importantes e/ou impactantes decisões
de majoritários, como: aprovação de integração ou majoração de capital de
companhia; modificações no objeto social e finalidade da companhia, que gerem
redução compulsória na distribuição de dividendos; nos casos de fusões ou
aquisições .
A CVM Guidelines e as normas
de conduta do IBGC recomendam o uso de mediação e arbitragem na resolução de
conflitos de interesses dos acionistas e recomenda-se tais previsões constarem
dos artigos de constituição da companhia.
Empresas de economia mista, controladas pelo governo, devem
implementar princípios básicos de governança. O Conselho de Defesa das Capitais
do Estado (CODEC) estabeleceu regras por meio de manual de princípios de
governança para empresas controladas pelo Estado (estatais). Da mesma forma, as
empresas de controle estatal que negociam no mercado de capitais, devem seguir
as regras legais próprias de tais mercados; como Novo Mercado, Nivel 1 e Nivel 2.
TRANSPARÊNCIA E ANTICORRUPCAO
– AGENDA GLOBAL, APLICAÇÃO LOCAL
O Brasil é signatário da Convenção Interamericana Contra a
Corrupção, firmado em 1996 na Organização dos Estados Americanos (OEA). Embora não
sendo membro da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) assinou compromissos internacionais como signatário da Convenção sobre o
Combate da Corrupção de Funcionários Estrangeiros em Transações Comerciais da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O Brasil participa
dos programas como economia emergente e se submete às politicas desenvolvidas e
monitoradas pelo OCDE, visando maior escala de negócios internacionais e
desenvolvimento de sua economia no cenário global. A partir desses compromissos
internacionais, o Brasil passou por uma reforma legislativa, adequando-a aos
programas de anticorrupção e transparência estabelecidos como critérios contábeis,
legais e éticos cada vez mais estreitos, visando combater, punir e disseminar a
prática da corrupção entre empresas e entidades governamentais. O Brasil, com o
advento da Lei 12.846/2013, encontra-se na fase 4 do programa de monitoramento
e avaliação da OCDE.
DISPOSIÇÕES
GERAIS DA LEI ANTICORRUPÇÃO 12.846/2013
A nova lei 12.846/13, não introduz tipificação nova. Ato de
corrupção é crime tipificado no Código Penal. Em conjunto com a Lei de
Improbidade (Lei 8.429/92), a Lei de Lavagem de Dinheiro (lei 12.683/12), a Lei
de Licitações (lei 8.666/93), e ainda a Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência (lei 12.529/2011), a proteção legal contra ato de fraudar a
Administração Pública, a licitação, oferecer ou dar vantagem indevida a agente
público, utilizar-se de interposta pessoa (“laranja”) para ocultar ou dissimular
seus reais interesses ou a identidade do beneficiário, foram vislumbradas na
Lei Anticorrupção, a reponsabilidade civil da empresa beneficiada pela conduta
considerada ilícita.
Diz o art. 5º, inciso I, da Lei 12.846/13 que constitui ato lesivo à
Administração Pública “prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente,
vantagem indevida a agente público ou a terceira pessoa a ele relacionada” e no
inciso II, refere-se ao ato de “comprovadamente financiar, custear, patrocinar
ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos”.
O que a lei 12.846/2013 introduz de novo é a natureza civil e administrativa do combate à corrupção e a responsabilidade
objetiva da personalidade jurídica que por meio do ato ilícito e danoso à
Administração Pública, realiza negócios espúrios com agentes governamentais
para obtenção de vantagem na retenção de seus contratos com o Governo. Portanto
o principal motivador da Lei é validar os princípios globais da competição
justa e a disseminação da anticorrupção como instrumento de negócio. Acima de
tudo visa a conformidade, o “compliance”, valorizando a transparência e a boa
prática dos princípios da governança em alcance ampliado.
A lei alcança empresas brasileiras ou estrangeiras por atos lesivos praticados contra a
administração pública nacional e ainda empresas brasileira em atos lesivos
praticados contra a administração pública estrangeira, ainda que cometidos no
exterior.
Como mecanismo de anticorrupção, a lei imputa a responsabilidade
objetiva da empresa – pessoa jurídica, sem exclusão da percussão penal face à
responsabilidade subjetiva de seus dirigentes e colaboradores; de vigiar a
conduta empresarial e negocial e privilegiar a boa pratica e programas
estruturados de compliance e transparência dessa conduta de negócios com a
Administração Pública.
A sanção na esfera administrativa inclui multa de 0,1% a 20% do
faturamento bruto do último exercício (nunca inferior à vantagem econômica
auferida), e se impossível auferir entre R$ 6Mil e R$ 60Milhões, e a
divulgação/publicação extraordinária da decisão condenatória.
Fatos agravantes da prática ilícita, podem se cumular às sanções na
esfera judicial. A lei prevê a possibilidade de sanções cumulativas de multa, de
perdimento de bens, direitos ou valores, suspensão ou interdição parcial das
atividades da empresa, dissolução compulsória da pessoa jurídica ou proibição
de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos
ou entidades públicas e de entidades financeiras públicas ou controladas pelo
poder público.
As sanções da Lei 12.846/13 implicam na inclusão da empresa no
Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP e no Cadastro Nacional de Empresas
Inidôneas Suspensas-CEIS, ambas de caráter público. A aplicação das sanções
previstas na Lei 12.846/13 não excluem ou impedem outras medidas e sanções,
inclusive os procedimentos criminais específicos à Lei das Licitações e
infrações à ordem econômica decorrentes de ato de improbidade.
Acordos de leniência e
reparação ao dano causado
Uma particularidade na lei 12.846/13
é a possibilidade da empresa valer-se de acordo de leniência desde que
colaborem com as investigações e o processo administrativo. Isso implica em
confessar e colaborar na coleta de provas do ato ilícito. A celebração do
acordo isentará a pessoa jurídica da sanção “publicação extraordinária da
decisão condenatória” e da proibição de receber incentivos, subsídios,
subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de
instituições financeiras publicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo
de 1 a 5 anos.
Fatores serão considerados
para moderar as sanções, entre eles, a existência de mecanismos e procedimentos
internos de integridade, auditoria e incentivo à denuncia de irregularidades e
a aplicação efetiva de código de ética e de conduta no âmbito da pessoa
jurídica. Ou seja, programa efetivo e em curso na área de COMPLIANCE.
Por isso um Programa bem estruturado de Compliance passa a ser
ferramenta e investimento tanto da imagem da empresa quanto de controlador de
riscos do negócio.
DESENVOLVIMENTO DE PROGRAMA
DE COMPLIANCE
Quais são os atributos gerais que um sistema de compliance deve
conter para ter o reconhecimento público e o benefício de atenuante? Aqui
alguns exemplos:
•
Processos adequados à
Governança Corporativa, incluindo especificidades da Lei 12.846/13;
•
Mecanismos de prevenção e
procedimentos internos de integridade.
• Programa de compliance estruturado. A liderança da empresa deve
estar compromissada com o programa e os seus incentivos. SISTEMA DE
INVESTIGAÇÃO E REMEDIAÇÃO. Operacional adequado e Código de Conduta devidamente
estruturado para atender as exigências de conformidade empresarial, negocial,
jurídico-legal e de risco.
• ANÁLISE DE RISCOS – Conhecer o negócio e o mercado. Reconhecer os
riscos e assegurar conformidade com a legislação local e internacional. Ao
detectar riscos, a empresa deve remediar as ações e tomar relevantes atitudes
para remediar o problema.
• EFETIVIDADE DO PROGRAMA – Programa deve estar em constante avaliar e
demonstrar progresso nas boas práticas empresariais e com efetivo CONTROLE E
SUBORDINAÇÃO dos atores aos valores da empresa, sejam eles controladores ou
colaboradores.
•
ESTRUTURAÇÃO – o programa de
compliance deve ser sustentado por mecanismo próprio, independente e com
adequada importância na estrutura de poder da empresa e da governança. A
INDEPENDÊNCIA NAS OPERAÇÕES do setor de compliance deve estar garantida na política
da empresa. Com adequada ALOCAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS e MATERIAIS.
•
IMPLEMENTAÇÃO DE PROGRAMAS DE
CONFLITOS e MECANISMO DE CONTROLE E INVESTIGAÇÃO INTERNA. Garantia de anonimato
e CONFIDENCIALIDADE, Existência de canal de denúncia para coleta e sistema de
investigação dos casos, com relatórios
direto à autoridade da Governança Corporativa, e designação das ações
decorrentes da apuração.
•
ACOMPANHAMENTO DE RESULTADOS –
monitorar e revisar o programa. Pequenas alterações e avanços devem ser
constantes e dinâmicos.
•
TREINAMENTO - manter empregados
e colaboradores e terceiros regularmente treinados e informados sobre a
politica da empresa, material de treinamento em fácil linguagem e entendimento,
revisão e avaliação do processo de melhoria do próprio programa.
•
POLÍTICAS DE REVISÃO,
REESTRUTURAÇÃO E PERIDIOCIDADE NO
TREINAMENTO e alterações necessárias.
•
Clareza quanto às RESPOSTAS AOS
CASOS DE VIOLAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, REMEDIAÇÃO E REFORMULAÇÃO DO PROGRAMA.
•
ANÁLISE DOS ELEMENTOS E
REMEDIAÇÃO DA IRREGULARIDADE, preparo da documentação e dos elementos de
colaboração antes de RELATAR ÀS AUTORIDADES.
Bibliografia
·
LODI, João Bosco, “ Governança
Corporativa : O Governo de Empresa e o conselho e Administração”, 2000, pag 25,
4ª ed. INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA. www.ibgc.org.br
·
Instituto Brasileiro de
Governança Corporativa. Código das melhores práticas de governança corporativa.
4.ed. / Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. São Paulo, SP : IBGC,
2009. 73 p. ISBN: 978-85-99645-14-7
·
BOLSA DE VALORES DE SÃO PAULO.
Regulamento de Listagem do Novo Mercado. Disponível no site www.bovespa.com.br, consultado em
10/08/2002.
·
CERDA, A.
C. Tender Offers, Takeovers and
Corporate Governance. The Latin America Corporate
Governance Roundtable, São Paulo, April, 2000.
·
GITMAN, L. J. Princípios de
Administração Financeira. 7ª. Edição. São Paulo: Editora Harbra, 1997.
·
GRUPO ORSA. Informações
Institucionais. Disponível no site www.grupoorsa.com.br.
·
INSTITUTO BRASILEIRO DE
GOVERNANÇA CORPORATIVA. Código Brasileiro da Melhores Práticas de Governança
Corporativa. Edição Ampliada, 2001.
·
KRUGMAN, P. EUA resistem a
fazer mudanças que evitariam fraudes contábeis. Folha de São Paulo. São Paulo,
22/05/2002.
·
LA PORTA, R. LOPEZ-DE-SILANES,
F. SHLEIFER, A. VISHNY, R Investor Protection and Corporate Governance. NBER Working Paper, disponível em www.nber.org.
·
MAHONEY, W. F. Relações com
Investidores. Rio de Janeiro: IMF Editora, 1997.
·
MALUF J. A. Seminário sobre
Governança Corporativa. Organizado pela Bradesco Templeton Asset Management,
São Paulo, 2000.
· MCKINSEY & COMPANY. Investor Opinion Survey
on Corporate Governance. London, July, 2002. Investor Opinion Survey on Corporate
Governance. London, June, 2000.
·
MCKINSEY
COMPANY E KORN/FERRY INTERNATIONAL. Panorama da
Governança Corporativa no Brasil. São
Paulo, 2001. Disponível em www.ibgc.org.br.
· OECD – ORGANIZATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION
AND DEVELOPMENT. OECD Principles of Corporate Governance, Paris, 1999.
·
WAACK, R. S. Governança
Corporativa e Eficiência na Gestão – Grupo Orsa. Seminário de lançamento da
RAUSP (Revista de Administração da USP)-abril-junho/2002, São Paulo, agosto,
2002.
·
YIN, R. K. Estudo de Caso –
Planejamento e Métodos. 2ª. Edição. Porto Alegre: Bookman, 2001.
·
ZINGALES, L. Corporate
Governance. NBER Working Paper 6309, consultado no www.nber.org/papers/w6309 em 30/10/2001.
·
OECD (2013), "Country
statistical profile: Brazil", Country statistical profiles: Key tables
from OECD.
http://www.oecd-ilibrary.org/economics/country-statistical-profile-brazil_csp-bra-table-en
Nota sobre os autores:
Renata Fonseca de Andrade – Vice-Presidente
da Comissão de Direito Internacional e relatora da Comissão de Ética e
Disciplina, ambos da OAB/Pinheiros, Advogada sócia da Fonseca Andrade
Advocacia. Mestrado em Direito Internacional e especialista em Governança, Integridade, Anticorrupção,
Anti-Bribery e Compliance Coorporativa.
Danilo Yoshiaki Fujita - Presidente da
Comissão de Direito Internacional da OAB/Pinheiros. Advogado Associado na
Advocacia Masato Ninomiya, especializado em Direito Empresarial e Presidente da
Comissão de Direito Internacional da OAB/Pinheiros.
No comments:
Post a Comment